A tentativa de aproximação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com os partidos do Centrão é marcada por um clima de desconfiança mútua e causou uma espécie de cisão nas bancadas destas siglas. Com o início da nova legislatura e a vitória histórica de Arthur Lira (PP-AL) na Câmara, articuladores do Planalto iniciaram as primeiras movimentações para destravar as indicações para os segundo e terceiro escalões da máquina pública, a fim de ampliar a base de apoio no Congresso Nacional. Em alguns casos, porém, o acordo esbarra em pedidos ambiciosos. O comando da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), da Sudeco (Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste) e do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), além de diretorias dos Correios, por exemplo, estão entre as prioridades dos caciques partidários. Por outro lado, alas menos pragmáticas destas legendas defendem uma oposição firme ao Planalto e cogitam, inclusive, obstruir votações de propostas tidas como fundamentais para o Executivo.
Interlocutores de Lula ouvidos pela reportagem afirmam que o presidente da República quer testar a fidelidade dos congressistas antes de avançar nas negociações. Líderes de partidos como Progressistas (PP), Partido Liberal (PL) e Republicanos, no entanto, condicionam a entrega de votos à concessão de espaços no governo. Mais do que isso, a entrega de cargos estratégicos de alguns ministérios a aliados do Planalto está entre as principais reclamações do Centrão. A pasta foi entregue à deputada federal Daniela Carneiro, que é do União Brasil, mas a autarquia especial ligada à pasta, o Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR), foi entregue ao ex-deputado federal Marcelo Freixo, que deixou o PSB para se filiar ao PT.
Apesar das negociações, a articulação política do governo Lula sabe que não contará com o apoio integral das bancadas de PP, PL e Republicanos. A ideia é furar a blindagem destes partidos e conquistar votos no varejo, avançando aos poucos com costuras de bastidores. A pessoas próximas, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder do governo no Congresso Nacional, costuma dizer que, para ter um cenário confortável no Parlamento, o governo trabalha com a possibilidade de ter uma base de 55 senadores e 320 deputados. Com esses números, o Planalto teria votos necessários para aprovar, por exemplo, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que exige, no mínimo, 49 votos no Senado e 308 na Câmara. Um exemplo de aceno do PT ao partido comandado por Valdemar Costa Neto ocorreu na quarta-feira, 8, quando o deputado Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP) foi eleito para coordenar a bancada do Estado de São Paulo na Câmara. Como a Jovem Pan mostrou, ACR, como é conhecido, contou com o voto de todos os deputados paulistas do Partido dos Trabalhadores. Ex-ministro do governo Dilma, Rodrigues integra uma ala do PL simpática ao diálogo com o Executivo. Até mesmo deputados ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro reconhecem que o Planalto terá o apoio do que chamam de “dissidentes”. A deputada federal Bia Kicis (PL-DF) diz ter a expectativa de que o PL, que possui a maior bancada da Câmara, com 99 deputados, faça uma “oposição firme” a Lula, embora reconheça que a postura não será unânime. “Adesão integral não dá para dizer, porque sempre há os dissidentes”, comentou. “Não há racha”, ressalta a parlamentar.